O Reidi de roupa nova na reforma tributária

A reforma tributária do consumo, inaugurada pela Emenda Constitucional nº 32/2023, será regulamentada em duas fases. A primeira, por meio da recentíssima Lei Complementar nº 214/2025, que instituiu o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), a Contribuição Social sobre Bens e Serviços (CBS) e o Imposto Seletivo (IS), além de criar o Comitê Gestor do IBS. A segunda será resultante do PLP nº 108, que tratará do contencioso tributário, obrigações acessórias, penalidades tributárias e regras de competência do comitê gestor.

Permanecem, no entanto, muitas dúvidas sobre os controversos benefícios fiscais, rechaçados por uns e tidos como indispensáveis por outros, como aquele denominado Regime Especial de Incentivos para o Desenvolvimento da Infraestrutura (Reidi).

Criado pela Lei nº 11.488/2007, regulamentado pelo Decreto nº 6.144/2007 e, atualmente, disciplinado pela Instrução Normativa RFB nº 2121/22, o Reidi tem como objetivo a desoneração tributária na implantação de projetos de infraestrutura nos setores de transportes, portos, energia, saneamento básico e irrigação.

O programa consistia, até o advento da reforma tributária, na suspensão da incidência do PIS e da Cofins sobre as receitas decorrentes das aquisições de bens e serviços destinadas à utilização ou incorporação em obras de infraestrutura, e que posteriormente são convertidas em alíquota zero.

Com a publicação da LC nº 214/2025, o Reidi foi mantido em seu artigo 106, com a mesma cara de antes, mas com uma roupa nova: a suspensão do PIS/Cofins foi substituída, logicamente, pela suspensão da CBS. Mas não é só: sendo dois lados de uma mesma moeda, o IBS, igualmente, deverá ser suspenso nas operações realizadas ao abrigo do Reidi.

Ou seja, a antiga tributação do ICMS e ISSQN nessas operações, agora substituídos pelo IBS, estarão suspensos, desonerando a carga tributária nessas atividades. O dispositivo é claro: “serão efetuadas com suspensão do pagamento do IBS e da CBS as importações e as aquisições no mercado interno de máquinas, aparelhos, instrumentos e equipamentos, novos, e de materiais de construção, realizadas diretamente pelos beneficiários do Regime Especial de Incentivos para o Desenvolvimento da Infraestrutura (Reidi) para utilização ou incorporação em obras de infraestrutura destinadas ao ativo imobilizado”.

E isso é uma boa notícia, pois são diversos os incentivos fiscais de ICMS oferecidos para o fornecimento de bens de capital no desenvolvimento de obras de infraestrutura que reduzem a carga tributária nessas operações.

Por outro lado, a suspensão do ISSQN, agora incorporado no IBS, é novidade significativa para o setor, especialmente para os prestadores de serviços, como construtoras e empreiteiras, antes sujeitas à alíquota máxima do imposto municipal (5%), como regra.

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A medida é louvável por vários motivos: (a) a infraestrutura nacional ainda caminha a passos lentos; (b) a reforma tributária do consumo representará uma elevação considerável da carga tributária para o setor de serviços, que tem na mão de obra o seu principal insumo e, até o momento, não se tem notícias de que esse insumo ensejará o crédito da CBS/IBS; (c) a criação do Imposto Seletivo incidente sobre a mineração representará a majoração de insumos básicos da construção pesada, como ferro e demais agregados da construção civil, sempre esquecidos, como brita e areia; (d) as receitas da construção de obras de engenharia, antes sujeitas às alíquotas reduzidas do regime cumulativo (3,65%), passarão para, nada menos, que 26,5%, já se prevendo que poderá chegar a 28%.

Como se nota, a suspensão do IBS (ICMS+ISSQN), no âmbito do Reidi, desonera significativamente a cadeia de consumo em obras de infraestrutura, contribuindo para o desenvolvimento nacional.

De se notar, ainda, que nos termos do artigo 106, §4º da LC nº 214/2025, os benefícios do novo Reidi se aplicam “inclusive, aos projetos em andamento já habilitados perante a RFB”.

Sapato velho

A previsão da suspensão do IBS no âmbito do Reidi contribuirá, em boa medida, com a redução da litigiosidade em torno do tema. Apenas para ilustrar, cite-se a antiga disputa acerca da possibilidade de dedução dos materiais empregados na prestação de serviços de construção civil da base de cálculo do ISSQN, objeto do Tema nº 247 (Recurso Extraordinário nº 603.497) do Supremo Tribunal Federal.

Ou, ainda, a tributação incidente sobre o fornecimento de pré-moldados, já afastada pelo Superior Tribunal de Justiça (AgRg no Ag 1.130.668/SP, relator ministra Denise Arruda, 1ª Turma, julgado em 6/8/2009, DJe 24/8/2009).

Naturalmente, outras velhas contendas que hoje giram em torno do Reidi serão mantidas, como a incompetência do poder público em concluir, em tempo razoável, a análise de pedidos de habilitação ao Reidi, ensejando o ajuizamento de ações para que se cumpra o prazo legal para tal conclusão.

De toda sorte, a desoneração do IBS no âmbito do Reidi vem em boa hora, sendo certo a majoração da carga tributária para o setor de serviços, tornando ainda necessário a permanência do programa, ao menos até que se fique claro o real impacto da reforma tributária sobre o segmento da construção.

Como fala a canção, o Reidi segue sendo um sapato velho, que ainda serve, sobretudo, com uma roupa nova.



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