Recente julgado proferido, em 22 de abril de 2025, pela 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, no Recurso Especial 2.141.417, assentou que a Súmula 308 da corte, segundo a qual “a hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel”, não se aplica a imóvel comercial, oportunidade em que firmou o entendimento de que o contrato de promessa de compra e venda sem registro no cartório imobiliário, mesmo que celebrado antes da hipoteca, não é oponível ao agente financeiro que recebeu o imóvel comercial como garantia real, o que revela um gravíssimo retrocesso na temática da proteção dos adquirentes de imóveis na planta.
Com efeito, a Súmula 308 do STJ foi editada dentro do contexto da decretação da falência da maior incorporadora deste país em 1993 (construtora Encol), propiciando-se a que o Poder Judiciário viesse a se manifestar sobre a ineficácia da hipoteca concedida ao agente financeiro sobre a unidade autônoma (apartamento) objeto de contrato de promessa de compra e venda.
De um lado, havia os agentes financeiros que estavam a executar judicialmente as garantias reais (hipotecas) sobre os imóveis prometidos à venda a promissários-compradores e, de outro lado, havia os promitentes-compradores que adquiriram de boa-fé os imóveis dados em garantia real (hipoteca) em favor de agente financeiro.
Garantia do financiamento
A partir do princípio da função social dos contratos, entendeu-se que a garantia hipotecária do financiamento concedido pelo Sistema Financeiro da Habitação para a construção de imóveis não atinge o promitente-comprador da unidade autônoma, de sorte que a hipoteca instituída pela construtora ao agente financeiro, em garantia do pagamento do empréstimo regido pelo SFH, que recai sobre unidades autônomas, é ineficaz perante os promissários-compradores, a partir de quando celebrada a promessa de compra e venda.
Por conseguinte, o adquirente de unidade habitacional somente é responsável pelo pagamento integral da dívida relativa ao imóvel que adquiriu, não podendo sofrer constrição patrimonial em razão do inadimplemento da empresa construtora perante o banco financiador do empreendimento, posto que, após celebrada a promessa de compra e venda, a garantia passa a incidir sobre os direitos decorrentes do respectivo contrato individualizado, nos termos do artigo 22 da Lei 4.864/1965 (REsp 409.129, rel. min. Aldir Passarinho Junior).
O verbete da Súmula 308 do STJ não é alterado pelo fato de o contrato de compra e venda não ser regido pelas normas do SFH (AgInt no REsp 1.966.297, relator ministro Villas Bôas Cueva).
Spacca

Jurisprudência do STJ
A conclusão adotada no REsp 2.141.417 está em sintonia com o entendimento adotado na jurisprudência do STJ, no sentido de que a Súmula 308/STJ não se aplica aos contratos de aquisição de imóveis comerciais, incidindo apenas nos contratos em que a hipoteca recai sobre imóvel residencial, sendo válida a hipoteca outorgada pela construtora ao agente financeiro quando firmada anteriormente à celebração da promessa de compra e venda de imóvel comercial (AgInt no REsp 1.702.163, relator ministro Raul Araújo).
Entretanto, a distinção entre imóveis residenciais e comerciais para atrair a incidência ou não da súmula 308 do STJ não tem amparo legal, nem tampouco no princípio da função social dos contratos.
É que, em se tratando de imóvel vendido na planta, o agente financeiro, que pretende emprestar capital para a construção do empreendimento imobiliário, tem ciência da existência em potencial do promitente comprador de unidade autônoma, o que é suficiente para atrair a incidência da função social dos contratos com o propósito de se outorgar a tutela externa do direito aquisitivo do adquirente sobre o imóvel.
Ademais, não se pode desprezar que a teleologia da Súmula 308 do STJ é, pois, proteger o terceiro adquirente de boa-fé que quitou o preço frente ao agente financeiro, independentemente da natureza residencial ou comercial do imóvel.