atuação e remuneração do administrador judicial


Opinião

A Lei nº 11.101/2005, recentemente alterada pela Lei nº 14.112/2020, traz em sua Seção III a figura do administrador judicial (AJ) nos processos de insolvência. Inúmeras são as suas atribuições, que foram, inclusive, majoradas com a recente alteração legislativa, e estão pontuadas, principalmente, no artigo 22 da referida lei.

Ao analisar todas as competências, pode-se concluir que, para um bom andamento processual, tanto da recuperação judicial quanto da falência, imprescindível o empenho do auxiliar do Juízo em questão. O reflexo da novel legislação e as exigências do Conselho Nacional de Justiça para o exercício da função têm resultado em profissionais cada vez mais especializados e capacitados na área para assumir o cargo.

Nada obstante as discussões quanto aos direitos e deveres deste expert, a importância da sua atuação, de forma imparcial e íntegra, é indiscutível. Tal encargo é reconhecido como substancial para a aplicação das normas legais de forma eficiente, garantindo, assim, a higidez nos procedimentos de insolvência. Assim, diante das enormes responsabilidades inerentes à atividade, necessária uma contraprestação equivalente.

Remuneração na recuperação judicial e na falência

No caso do administrador judicial, os artigos 23 e 24 da lei especial trata sobre as formas e bases de cálculos utilizadas para se fixar a remuneração do auxiliar. Nesse contexto, verifica-se que o percentual definido na recuperação judicial tem como base de cálculo o total do passivo do processo de soerguimento.

Já na falência, para além do percentual do valor da venda dos bens supramencionado, a jurisprudência pátria tem entendido que este percentual também é aplicado sobre a totalidade de ativos ou direitos arrecadados, não só das vendas dos bens, a fim de remunerar condignamente os serviços prestados pelo administrador [1]. À vista disso, a remuneração do auxiliar em processos de falência pode alcançar até 5% sobre os bens de ativos ou direitos arrecadados.

Spacca

Superada a questão do quantum devido a título de remuneração do administrador judicial em processos de falência, adentro no tema referente à sua classificação na ordem de pagamentos.

A Lei nº 14.112/20 alterou, dentre outros, o artigo 84, o qual trata dos créditos extraconcursais na falência e sua ordem de pagamento. Antes das referidas mudanças advindas pela lei supradita, a primeira obrigação a ser adimplida na falência eram os honorários do administrador judicial (84, I) referente à sua atuação no processo falimentar e, através disto, dando causa a qualquer recebimento.

Despesas indispensáveis à administração da falência

Contudo, ao modificar o artigo 84, o legislador desmembrou o inciso I em cinco incisos, indo do artigo 84, I-A ao artigo 84, I-E. Nestes, a remuneração do administrador judicial foi inserida no inciso I-D, sendo preterida às despesas indispensáveis à administração da falência que foram antecipadas (artigo 150); aos créditos trabalhistas de natureza salarial dos últimos três meses antes da quebra (artigo 151); ao crédito do financiador, eventualmente concedido durante a recuperação judicial; e aos créditos das restituições que eventualmente tenham que ser realizadas em dinheiro.

Destaca-se, entretanto, o inciso I-C, nos quais, em regra, classificam-se os pedidos de restituição da Fazenda Nacional, com fulcro no artigo 86 da mesma lei.

Quando uma empresa tem sua falência decretada, é comum encontrar um passivo tributário altíssimo, incluindo valores que deverão ser restituídos para o fisco em razão do não recolhimento da empresa no momento devido. Acontece, que esses valores costumam ser vultuosos e, em contrapartida, as falências costumam ser parcialmente ou totalmente frustradas.

Honorários mínimos

Nesse sentido, têm-se observado alguns posicionamentos sobre a remuneração do AJ nos mais diversos cenários falimentares. A exemplo disso, percebe-se que nos casos em que não se encontram quaisquer ativos nas diligências iniciais do processo de falência, o administrador poderá propor ao Juízo Universal que os credores prestem caução de honorários mínimos ao auxiliar [2].

No REsp 1.526.790-SP, o STJ firmou o entendimento de que nos casos de falências requeridas por credores, deverá ser caucionado o valor mínimo necessário para pagamento da remuneração do AJ, tendo em vista que se trata de principal auxiliar do juízo na condução do feito falimentar e que não há o se falar em exercício da função de forma gratuita. Por conseguinte, havendo arrecadação suficiente, tais valores serão inscritos no Quadro Geral de Credores na forma do artigo 84, II da lei regente.

Na mesma sorte, Manoel Justino harmoniza com o posicionamento supradito ao afirmar que “não haveria como pretender-se que o árduo trabalho exigido do administrador judicial fosse prestado sem garantia de remuneração […]. Enfim, é intuito que não se pode determinar a alguém que exerça um trabalho, sem que se lhe preste a correspondente remuneração” [3]

Na mesma lógica, nos casos em que se encontram ativos, mas não o suficiente para adimplir todas as classes e alcançar o artigo 84, I-D — leia-se: a maioria das falências —, conclui-se que o administrador judicial que laborou para arrecadar os ativos remanescentes da empresa falida, com o fim de satisfazer o máximo de credores possível, nada receberia pelo exercício da sua função.

Nesse cenário, importante transcrever as palavras do magistrado da vara especializada de São Paulo Paulo Furtado no processo nº 0337347-73.2009.8.26.0100, “não há processo falimentar sem que exista a figura do administrador judicial. Assim, é imprescindível que ele receba a devida remuneração em casos em que os ativos arrecadados seriam destinados a pagamento preferencial de outros credores ou titulares de direito à restituição, que, a bem verdade, só recebem porque houve atuação do Administrador Judicial”.

Andamento falimentar depende do administrador judicial

Pelo contexto, ao aplicar os entendimentos alhures mencionados, é bem verdade que não há andamento falimentar sem o esforço investido pelo administrador judicial. Assim, neste processo que tramitou em São Paulo, o magistrado entendeu e fixou a remuneração do AJ como indispensável, sendo adimplida como prioridade acima de todos os credores.

Sob esse prisma, extrai-se da legislação falimentar o artigo 114-A, §1º, o qual determina que os credores poderão requerer o seguimento de uma falência potencialmente frustrada, desde que paguem a quantia necessária às despesas e aos honorários do AJ, que serão considerados despesas essenciais nos termos estabelecidos no inciso I-A do caput do artigo 84 da lei em referência.

Entrementes, imperiosa a ilação de que nos casos em que a massa falida não tiver arrecadado ativos suficientes para adimplir as classes dos incisos I-A, I-B e I-C do artigo 84 e, assim, não alcançar a remuneração devida ao administrador judicial; o auxiliar, que exerceu a seu múnus em benefício da coletividade de credores, deverá ser considerado como despesas essenciais ao andamento do feito e ter seus honorários classificados com arrimo no artigo 84, I-A c/c artigo 114-A, §1º.

 


[1] (TJ-PR – AI: 00056001520228160000 Londrina 0005600-15.2022.8.16.0000 (Acórdão), Relator: Fabio Andre Santos Muniz, Data de Julgamento: 09/05/2022, 17ª Câmara Cível, Data de Publicação: 09/05/2022);

(TJ-SP – AI: 20814690520218260000 SP 2081469-05.2021.8.26.0000, Relator: Alexandre Lazzarini, Data de Julgamento: 08/09/2021, 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, Data de Publicação: 08/09/2021);

(TJ-PR – AI: 00596399320218160000 Londrina 0059639-93.2021.8.16.0000 (Acórdão), Relator: Fabio Andre Santos Muniz, Data de Julgamento: 07/02/2022, 17ª Câmara Cível, Data de Publicação: 07/02/2022).

[2] (STJ – AREsp: 2112691 DF 2022/0117698-0, Relator: Ministro MARCO BUZZI, Data de Publicação: DJ 31/08/2022)

(TJ-SP – Agravo de Instrumento: 2286331-98.2022.8.26.0000 Santos, Relator: Ricardo Negrão, Data de Julgamento: 10/03/2023, 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, Data de Publicação: 10/03/2023)

(TJ-RS – AC: 02509583520198217000 PORTO ALEGRE, Relator: Lusmary Fatima Turelly da Silva, Data de Julgamento: 07/08/2020, Quinta Câmara Cível, Data de Publicação: 06/10/2020)

(TJ-DF 07114049220208070015 DF 0711404-92.2020.8.07.0015, Relator: MARIO-ZAM BELMIRO, Data de Julgamento: 02/06/2021, 8ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE : 16/06/2021 . Pág.: Sem Página Cadastrada.)

(TJ-SP – AI: 20530677420228260000 SP 2053067-74.2022.8.26.0000, Relator: Cesar Ciampolini, Data de Julgamento: 23/05/2022, 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, Data de Publicação: 23/05/2022)

[3] Filho, Manoel Justino Bezerra (Coord). Lei de Recuperação de Empresas e Falências, 12ª ed.



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