

Opinião
A Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) aprovou o pedido da Starlink para operar mais 7.500 satélites da segunda geração (GEN2) no espaço brasileiro, ampliando significativamente sua constelação. A decisão representa uma das maiores autorizações já concedidas para serviços satelitais no país. A empresa, que já possuía autorização para 4.408 satélites desde 2022, alega sobrecarga em regiões como São Paulo, Rio de Janeiro e Manaus, onde há dificuldade para atender novos clientes.
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A aprovação veio acompanhada de um alerta regulatório, sinalizando que a agência passará a avaliar de forma mais crítica os aspectos concorrenciais, de sustentabilidade orbital e soberania digital nas futuras renovações de licença — previstas para 2027.
Fato é que os satélites voltaram a ser estratégicos para o desenvolvimento da conectividade global, especialmente em países de dimensões continentais como o Brasil, onde ainda existem amplas regiões não cobertas por redes terrestres tradicionais.
Desde o lançamento do Sputnik pelos soviéticos em 1957, os satélites se tornaram elementos centrais na revolução das comunicações, da meteorologia e da navegação global. Hoje, com a chegada de uma nova geração de equipamentos menores, mais baratos e lançados por técnicas mais eficientes, assistimos a uma nova corrida espacial — agora com foco em constelações de satélites de órbita baixa (ou LEO, do inglês Low Earth Orbit), que operam a até 2.000 km da superfície terrestre.
Essa nova fase é marcada por nomes de peso. A SpaceX, por exemplo, por meio da sua rede Starlink, já lançou mais de 5.800 satélites ativos (de um total planejado de até 42 mil, considerando futuras gerações do sistema). Utilizando os foguetes reutilizáveis Falcon 9, desenvolvidos internamente, o custo por lançamento caiu drasticamente, permitindo missões frequentes e eficientes.
Mas essa explosão de atividade espacial traz sérios dilemas.
Céu está ficando cheio
A órbita baixa, embora pareça infinita, não é. O crescimento exponencial de satélites aumenta a probabilidade de colisões e a geração de lixo espacial que podem danificar ou inutilizar outros equipamentos. Um exemplo emblemático foi o alerta emitido pela Estação Espacial Internacional após a destruição deliberada de um satélite em teste militar, gerando milhares de detritos.
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Outro impacto é sobre a astronomia. A União Astronômica Internacional emitiu comunicados alertando para os riscos às pesquisas científicas dada as interferências causadas pelos satélites.
A regulação tenta acompanhar a tecnologia
Os reguladores ao redor do mundo vêm atualizando as exigências para lidar com os desafios da ocupação orbital.
Nos Estados Unidos, a FCC (Federal Communications Commission) passou a exigir uma governança mais rígida sobre o descarte de satélites e prevenção de colisões. Entre as exigências estão relatórios semestrais detalhados, métricas de falhas de descarte e comunicação direta com a Nasa para garantir a segurança espacial.
Na Itália, a Starlink solicitou acesso ao espectro da banda E para melhorar a comunicação entre estações terrestres e satélites. O pedido está parado há dois anos, pois as autoridades italianas aguardam uma decisão harmonizada da União Europeia sobre o uso desse espectro.
Oportunidade ou risco?
A verdade é que a nova corrida espacial democratiza o acesso à conectividade global. Com satélites LEO, comunidades isoladas passam a ter internet de qualidade, viabilizando educação, saúde e inclusão digital. A baixa latência dessas redes abre caminho para aplicações sensíveis, como cirurgias remotas, agricultura de precisão e monitoramento ambiental em tempo real.
Por outro lado, os desafios são concretos e crescentes. O aumento de satélites em órbita eleva os riscos de colisão e de geração de lixo espacial, comprometendo a sustentabilidade do uso do espaço a longo prazo. A concentração de operação nas mãos de poucas empresas também levanta preocupações sobre monopólios orbitais e desigualdades no acesso à infraestrutura crítica, além de tensões políticas.
Prós e contras da exploração em órbita baixa
Entre os benefícios, destacam-se a ampliação da conectividade para regiões remotas, a baixa latência dos serviços, a redução de custos com novos métodos de lançamento e o potencial de novas aplicações em segurança, emergência e observação da Terra.
Entre os riscos, estão o aumento da poluição espacial, a interferência na astronomia científica, a dependência de empresas privadas sem regulamentação internacional robusta e a possibilidade de disputas geopolíticas por ocupação de órbita e espectro.
O futuro da órbita baixa será definido por decisões técnicas, regulatórias e políticas nos próximos anos. A inovação e a conectividade prometidas pelas constelações LEO são fascinantes, mas exigem governança global, cooperação entre setores e uma visão responsável do uso do espaço. Afinal, como diz o provérbio: nem tanto ao céu, nem tanto à terra.